Qual a relação que existe entre pecado e doença?
A doença, considerada em si, é uma conseqüência natural do desequilíbrio ou desgaste dos órgãos e humores que constituem o corpo humano. Decorre, pois, do fato de ser o corpo um composto de elementos sujeitos a sofrer desajustamento entre si. A possibilidade de adoecer é assim inerente ao conceito mesmo de natureza humana.
A fé, porém, ensina que a doença, como ela hoje ocorre, não é fenômeno meramente natural.
Deus, ao criar os primeiros pais no estado de inocência, houve por bem conferir-lhes o privilégio de evitar a doença e a própria morte (dons da impassibilidade e da imortalidade). Caso perseverassem na amizade com Deus, não somente teriam sido isentos de qualquer moléstia, mas também haveriam gerado filhos possuidores da mesma prerrogativa.
Aconteceu, porém, que os primeiros pais pecaram. Em conseqüência, perderam o dom da impassibilidade; os achaques físicos ficaram sendo a sorte do gênero humano. Disto se segue que a doença que hoje acomete o homem, tem caráter religioso, é efeito de um pecado, de uma revolta contra Deus.
De passagem, pode-se notar que também entre os povos primitivos ainda existentes (pigmeus, tribos de índios, etc.) está espalhada a crença de que a doença e a morte entraram no mundo por efeito de uma desobediência dos homens contra o seu Autor.
Contudo não se poderia dizer que a moléstia é sempre conseqüência de pecado cometido pessoalmente pelo indivíduo doente. Era esta crença errônea que tornava perplexo o caso de Jó no Antigo Testamento: embora devorado pela lepra, este justo não tinha consciência de haver gravemente ofendido a Deus, como julgavam os seus três amigos. Depois de referir os debates entre o enfermo e seus visitantes, o livro de Jó dá finalmente a ver que Deus pode permitir a doença mesmo no homem virtuoso, a fim de comprovar a sua fé e libertá-lo das ilusões que a concupiscência e o mundo inspiram.
Aliás, depois que Cristo tomou sobre Si as conseqüências do pecado, as nossas misérias, inclusive, a doença, adquiriram valor novo, muito positivo: se a abraçamos em união com Jesus, ou seja, em espírito de expiação pelo pecado, a moléstia vem a ser nossa cruz salvífica que, à semelhança da cruz de Cristo, nos prepara para a ressurreição e a vida eterna. Nunca é a título de mero castigo que Deus envia a doença, mas é sempre com o fim providencial de santificar os homens, de os ajudar a se emancipar da natureza egoísta numa adesão mais perfeita ao Sumo Bem.
"Se morrermos com Ele (Cristo), viveremos com Ele.
Se padecermos com Ele, reinaremos com Ele".
(S. Paulo, 2 Tim 2,11-12).
Dom Estêvão Bettencourt (OSB)
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